Devo ter sido das mães de primeira viagem mais nabas de todos os tempos. Não li nada a não ser as diferentes fases da evolução da gravidez, não tive aulas pré-parto, não aprendi a acalmar as cólicas, acho que nem sabia que os bebés tinham disso. Se é que têm, porque uma vez, ainda eu não tinha recuperado de todo o choro, cansaço e exaustão do que era suposto serem as cólicas do meu, ouvi uma mãe cujo bebé chorava numa festa de anos alegar que as cólicas eram uma invenção. Ela não foi mais além, mas o que me pareceu que queria dizer era que as cólicas foram inventadas para justificar a inabilidade de certas mães - as outras, que não ela - para lidar com o choro dos bebés, ou seja, com os próprios bebés, com os próprios filhos.
Li muito pouco sobre as fases de crescimento e evolução dos bebés, nos primeiros meses nem ler consegui, tanto era o tempo que um bebé com muitas cólicas e muito choro me absorvia. Podia ter lido antes, mas para além de estar bastante preocupada a trabalhar como uma formiga freelancer para poupar para a licença de parto a que tinha direito como se apenas ganhasse o salário mínimo, achei que as coisas se resolviam de outra maneira. Pensava eu que o mimo, a paciência e o colo eram o remédio de todos os males. De certa forma são. Eu não contava era com o cansaço, as noites sem dormir, o acordar de duas em duas horas, o quase não ter tempo para tomar banho ou para comer. A dada altura, a exaustão dá cabo de tudo o resto. Não há quem aguente dar mimo, colo e ter paciência quando está em privação de sono.
Eu não li nada, mas leram por mim. A única coisa que registei de todo um livro sobre como lidar com um recém-nascido é que, se o embrulhassemos numa mantinha de determinada maneira, ele acalmava. Ainda hoje acho que foi sorte. Umas vezes acalmava, outras não. O mesmo com os remédios anti-cólicas: a dada altura já não sabia se faziam efeito, mas não conseguia deixar de lhos dar com medo que piorasse. Que seja, às vezes é preciso placebo para nos sentirmos mais calmos. E os outros pais de crianças da mesma idade que não, que dormiam, que os bebés eram muito calmos, não davam dores de cabeça a ninguém. Pois sim, uns tempos mais tarde, para aí aos nove meses (ou mais) do meu filho, quando o meu há muito já tinha passado a fase das cólicas e se tornava num bebé bem disposto e sossegado (nem os dentes deram muito trabalho, ao mesmo isso, bastaram-me as cólicas a partir do terceiro dia do nascimento), venho a saber que a tal criança super calma dos outros pais, com a mesma idade do meu, ainda era acalmada à custa daquele líquido cor-de-rosa/avermelhado doce. Não dava trabalho nenhum, não era? Fiquei a gostar muito pouco de pais perfeitos, para quem está tudo bem, cujas vidas são um paraíso desde que têm filhos. Há por aí muitas mães do Ruca.
O meu filho tem cinco anos, quase seis, vai entrar em setembro na escola primária e, não parece, mas tenho algum medo. Algum. Parece-me normal. Não estou apavorada, não estou a achar que não saberei lidar com eventuais problemas e dificuldades, estou apenas com a consciência de que as coisas vão mudar, que ele está a ficar grande e eu também.
Quase todos os dias passo os olhos por especialistas absolutamente surpreendentes sobre a existência das crianças, que dão conselhos que mudam a vida de não sei quantas famílias e hoje, domingo, começo o dia a ouvir uma psicóloga que escreveu mais um livro de coaching parental ou lá o que lhe queiram chamar. Não tenho nada contra psicólogos. Mas este tipo de livros já me fartam. Porque nenhum livro consegue chegar à especificidade de cada criança. E quem realmente precisa de ajuda só vai ficar mais confuso se comprar um livro destes para ler, ou se começar a ler vorazmente todos os artigos de opinião de pediatras que se multiplicam na internet e nas revistas.
É o que eu acho, mas eu sou só uma das mães de primeira viagem mais nabas que já existiu. Ainda assim, tive todos os instintos que não se explicam, toda a cumplicidade, toda a habilidade para lidar com tudo o que vai surgindo ao longo de cinco anos de crescimento (mesmo com as cólicas, mesmo com as birras). Não sou nenhuma mãe especial. A única coisa que me torna diferente é que o meu filho chorou tanto, mas tanto, quando era bebé, e eu tentei tanto, mas tanto e sem sucesso nenhum sossegá-lo com sussurros e cantorias e miminhos ao ouvido que, quando ele volta àquele choro sonoro que deixa toda a gente aflita, eu mantenho-me calma, quase sempre não consigo dizer nada.
Sou apenas mãe. Uma mãe que acha que somos melhores do que a sociedade nos quer fazer querer. Que tem tempo mesmo não tendo tempo, mesmo trabalhando fora de casa, mesmo chegando a casa exausta e a ter de continuar o trabalho no meio de roupas, loiça e refeições. Uma mãe que, de tanto lhe buzinarem aos ouvidos (o bebé chora tanto, deve ser isto, ou aquilo, não seria melhor...), percebeu cedo que muitos dos "problemas" são fases, passam sem fazermos nada por isso na maior parte dos casos. Quando não passam só porque sim, então trabalhemos para resolver a questão. Mas sem livros.
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