Não gosto de rabanadas, não gosto de bolo-rei, de frutos secos, de filhós, de bolinhos de abóbora, aletria provo a da minha avó só porque é Natal, leite creme também, nem sei se é típico da época mas ela costuma fazer e pode fazê-lo em qualquer altura do ano que é sempre delicioso. Os doces de Natal não são, definitivamente a minha onda e ainda assim lembro-me perfeitamente de Natais em que comi de tudo, só porque sim, porque é Natal, porque a mesa está posta e está sempre toda a gente a petiscar, tanto que quase se fica mal disposta e, passado o mal-estar, se sente necessidade de comer mais alguma coisinha outra vez, e depois à noite os bombons, que no a dada altura cheguei a ter verdadeiros bombardeamentos de chocolates.
Não sei bem o que mudou em mim. Acho que deixei de comer por comer, só porque sim. Porque nem sequer me sabia bem. Se vou dar baldas e encher-me de calorias, então que seja por algo que verdadeiramente me faça feliz, e isso passa por charlotes de chocolate e sobremesas que envolvam leite condensado e natas. A verdadeira viragem terá acontecido no primeiro Natal do meu filho, que então tinha pouco mais de um mês e chorava tanto que mal consegui engolir o bacalhau. Nos Natais que se seguiram ele precisava de atenção e eu precisava de dormir. Quando dei por ela tinha perdido a vontade. De me encher de comida só porque sim. Para depois voltar a encher-me de mais comida por estar cheia de culpa. É uma parvoíce que só entende quem já por ela passou. Não faz sentido, mas é assim. Não é só no Natal, mas tendo em conta a tradição da família à volta da mesa e de todas as doçuras que envolvem a época, este é um período crítico. E não estou a criticar ninguém, apenas a desabafar.
A mim, a gula passou-me. Mas, mesmo quando me vejo ao espelho bem mais magra, mesmo quando, sem qualquer sacrifício, não como determinados doces simplesmente porque me apetece, mesmo que tenha roupa que me fica a nadar, mesmo que agora os cintos giros das lojas não me sirvam porque são demasiado grandes, não consigo achar que estou magra, ou que o problema desapareceu. Sou uma gorda em recuperação, talvez para o resto da vida. E o problema, atenção, não foi ter estado mais gorda, foi o que isso me fez sofrer.
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