Há nuances, claro, mas no essencial é sempre igual. O despertador toca, eu aninho-me à espera do próximo toque, arrasto-me para fora da cama, pego na roupa que escolhi de véspera, enfio a roupa, tomo o pequeno-almoço, o café e o cigarro são o único luxo (vício) de que não dispenso, muitas vezes estendo a roupa lavada de véspera, à noite, para poupar uns trocos, saio de casa a correr, ou para a fisioterapia (comecei esta semana, às 8h) ou para levar o miúdo à escola. Muitas vezes aproveito o tempo que me "sobra" antes de entrar no trabalho para ir à mercearia, à peixaria, à frutaria, ou ao supermercado. Nunca levo tudo o que falta, é tudo a correr, enfia tudo na mala carrancuda porque sei que vou ter de carregar tudo para casa ao fim da tarde, juntamente com a carteira, as mochilas, a bata, o guarda-chuva. E fica sempre a faltar alguma coisa, pode ser que amanhã dê para lá voltar, que raio de vida. Quando chego ao trabalho já venho com pelo menos duas horas de "trabalho" em cima, mas isso que importa, isso não é nada, o trabalho é que é trabalho, o resto são trocos, ninguém quer saber disso. Mas os trocos repetem-se à tarde, saio do trabalho e vou buscar o miúdo à escola para o levar a casa e isso implica dar duas voltas completas à rotunda da Boavista, no Porto. Quem conhece a rotunda sabe que dar duas voltas àquilo ao fim da tarde devia ser garantia de um lugar no céu. Chego a casa e é preciso alimentar a criança, que vem cheia de fome e pede os alimentos às pinguinhas, agora isto, agora aquilo, não podes comer mais que está quase na hora de jantar, vira e revira o jantar, põe roupa na máquina, tira roupa da máquina, põe e tira do estendal, passa a ferro se houver tempo para isso, às vezes vai só dobrado, sem ferro, que é mais rápido, de volta à comida outra vez, ponho a mesa, chamo o miúdo, já vou, não quero, afinal quero, perguntam-me como emagreço, eu digo que não faço nada, a verdade é que quando me sento à mesa já não tenho vontade de comer, as calças que comprei no verão já me estão largas, levanta a mesa, lava a loiça ou mete na máquina, entretanto foi preciso arrumar a que lá estava, limpa tudo, brinca, deita, dorme tu que agora vou eu que já não aguento mais. Li hoje uma investigadora a desvalorizar essa coisa de facilitar a vida às mães trabalhadoras, não tenho agora aqui o jornal para o citar, mas há vidas e vidas, cara senhora, e esta vida que aqui descrevo nem será das piores, eu sou só uma péssima mãe trabalhadora que tem a ousadia de se queixar, não, não tenho empregada, nem bimby, mas não lavo a roupa à mão e até tenho máquina de a secar, não, não gosto de cozinhar nem de fazer tudo sozinha, mas há vidas que têm de ser assim porque sim. Folgas? Tenho, como toda a gente, normalmente aproveito para fazer em casa o que não tive tempo de fazer durante a semana e, lamento, isso não é descanso. Não, nem sequer estou a dramatizar, porque até podia entrar pelo discurso de "se isto não é ser uma super mulher não sei o que é". Mas não, hoje esta conversa toda é só para dizer que vou estar a trabalhar no fim-de-semana e que, por isso, que se lixe hoje o jantar, a roupa, a louça, quando sair do trabalho vou pintar as unhas com verniz gel.
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