Anestesia geral

Fui à urgência do hospital a pensar que talvez estivesse a exagerar. Tinha dores, mas nada agúdo ou súbito. A dor foi crescendo devagarinho, ao longo de três dias, estava a deixar-me num permanente estado de nervos e naquele sábado comecei a achá-la cada vez mais intolerável.

Fui à urgência por causa das dores, mas sem grande convicção. Imaginei que fosse mandada para casa por não ser um caso urgente. No limite, talvez me receitassem um antibiótico. Ou talvez cedessem a fazer-me uma pequena intervenção. Fui pensando nisto tudo enquanto esperava ser atendida, numa fila de cadeiras duras onde se foi sentar uma senhora muito nervosa, a julgar pela veemência com que abanava a perna (e as cadeiras).

Acabei deitada numa maca, a aguardar vaga no bloco para uma operação com anestesia geral. Senti-me no meio da "Anatomia de Grey", mas num daqueles dias em que acontece um desastre qualquer e o hospital fica tão cheio que nem há espaço para manobrar as macas e evitar encontrões contra a maca da desgraçada que teve de se despir e enfiar numa bata (o resto da malta, apesar de ter pulseiras com cores mais urgentes, está vestida e decente) porque tem um abcesso perianal subfissurário e pode ser levada para o bloco a qualquer momento.

Há sempre gente a entrar e a sair, e um enfermeiro incansável, apenas um, para acorrer às urgências de Pequena Cirurgia e Ortopedia. Os médicos são muitos, quase todos mais novos do que eu. Nem sou velha, tenho 38, e o rabo com uma bola de porcaria que pode ter sido causado por algo tão simples e aparentemente banal como um pelo encravado. Olho para eles nos olhos, eles nem por isso.

Parecem-me todos umas crianças, os médicos, com exceção de um, mais velho, que se desloca com vaidade e pretensão e é seguido por meia dúzia de miúdas de bata branca e ar compenetrado. 

Foi toda uma aventura. Só saí do hospital na segunda-feira, só regressei ao trabalho uma semana e meia depois. Mantenho ainda a sensação de que anestesiada já estava antes. E de que acabarei por ficar novamente, se não me cuidar e me deixar enredar nos pseudo-problemas do dia-a-dia. 

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