Gosto de roupa, de apreciar o desenho, os detalhes, a imaginação, de entrar nas lojas como quem vai a um museu, deixar-me deslumbrar, umas vezes sem conseguir deixar de experimentar, noutras vezes basta ver, para estar atualizada, saber o que se anda a fazer, perceber que caminhos percorre a criatividade, que vida pode ter um bocado de tecido.
O que trago vestido são umas calças de ganga, uns ténis, uma camisola branca, básica, bem acima do meu tamanho atual e sinto-me bem, hoje nem sequer me vesti à pressa. Mas também gosto de mais do que isso. Nada de formal, demasiado extravagante ou super na moda, sempre casual e descontraído e apenas o que me faz sentir especial e um bocadinho mais eu.
Muitas vezes preferia não ser nada assim, vestir o que calha, não me interessar nada por roupa, não entrar em lojas como quem vai apreciar obras de arte, não adorar sapatos e joalharia contemporânea. Mas passei muitos anos sem saber onde encontrar estas peças, sem falar no tempo em que vivi presa a uma suposta imagem que os outros teriam de mim e a uma censura social que não sei se era real ou imaginada, por ter um corpo e um peso fora dos padrões de beleza.
Tudo começou quando nem sequer era tão gorda assim, mas a imagem foi ficando, ainda hoje não foi me saiu do corpo e da alma, enfio-me num tamanho S e tenho medo de parecer gorda. Ou de ficar mais gorda e aquele tamanho deixar de me servir. Crises de confiança e auto-estima, uma vida inteira nisto, demasiado tempo a pensar no que os outros pensariam de mim. Agora não, acho que apenas me importa o que eu penso, o problema é que tenho o pensamento condicionado por muitos anos a pensar no que pensariam os outros.
Só assim se explica que me consiga enfiar num tamanho S e, em vez de dar pulos de contente, fique angustiada por pensar que pode deixar de me servir. Enfio-me na cama a pensar nisto, talvez não devesse ter comido cereais antes de me deitar, se calhar abusei no lanche, mas pouco comeste, deixa-te disso miúda, estás parva?. Só assim se explica que eu escreva que consegui "enfiar-me num tamanho S", como se tivesse sido algo de descomunal esforço, o vestido ou as calças a apertarem-me e eu a tentar enfiar lá para dentro as banhas, estúpida cabeça, rapariga, quando é que te vais deixar destas coisas?
É como se fosse um vaivém. Vai. Mas depois vem. Cruzo-me com um espelho e sinto-me bem, gira, um certo ar francês que me agrada, até me surpreendo com a figura esguia. Depois o vestido. S. Experimento. Serve. Se fosse um tamanho M por esta altura já não desconfiava que pudesse ficar mal. Mas é um S. Sempre fui L e XL (e às vezes quase XXL), como é que o S me serve? São só letras, estúpida, rótulos, deixa lá isso, depende dos modelos, o que é que importa? Mas será que fica bem? Parece que sim, mas ficará mesmo? Ninguém a quem perguntar, peço o maior. Não, o outro é que estava bem. Mas é mais pequeno, e se eu engordar. O que acha, parece-lhe apertado? Não? Pois, realmente, fica mesmo bem, parece feito à medida, miúda, estás uma elegância. Sim, realmente talvez precises de te tonificar um pouco, fazer exercício, mas vê de onde vieste e onde chegaste da única vez que não fizeste nenhum esforço para isso, martirizar-te é a única coisa que não deves fazer.
Tens razão.
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