O inverno mata-me

Já tenho saudades do último verão que não chegou a sê-lo, com as temperaturas dúbias, a chuva e o calor que não houve, que nem chegou para me deixar a transpirar, a sentir-me farta da pouca roupa, a ansiar pelos dias de dias de outono em que ficaria confortavelmente enroscada numa mantinha no sofá da sala, a beber chá e comer bolachas. Não houve nada disso, mas outubro teve dias de praia sem vento e céu perfeitamente azul e agora que o inverno chegou trocava aquela indefinição toda por este frio intercalado com chuva. A sensação que tenho , não há corpo que aguente tanta roupa, nem dona de casa que se conforme com o cesto da roupa cheio todos os dias, apensar de usar a máquina de lavar todos os dias. E a de secar também. Como é que se junta tanta roupa? 

Odeio o inverno, o inverno mata-me, com o frio, a chuva, não sei quantas camadas em cima de mim e da cama, que sou avessa a aquecedores enquanto conseguir sobreviver sem eles. Ou talvez o mal seja deste mês de janeiro, ou qualquer outro de outro ano qualquer. Não gosto de janeiro, pronto. Tem os mesmos 31 dias de julho ou agosto mas parece-me sempre interminável. Não é só um dia de janeiro que me parece o mais infeliz do ano, é todo o mês que me atormenta por parecer infindável, por ser um mês de nada, a não ser de espera - vejam-se as urgências, tanta gente doente, tanta gente à espera de médico, tanta falta de médicos ou sei lá de quê, se há sítio onde se pode tomar um banho de realidade é nas urgências de um hospital público, todos devíamos por lá passar de vez em quando. 

E, apesar disso, continuamos os dias, cortam o abono a quem ganha mais de 600 e tal euros, não sei agora ao certo o valor, a coisa estava tão preparada que recebi a carta do aviso menos de uma semana depois de ler a notícia do anúncio, quase perdida em plena crise de "ai que não nos metem medo, que somos todos pela liberdade de expressão e pelo Charlie Hebdo". Pelo abono ninguém disse um ai. Ainda há disso? Por muitas outras coisas também não. Quem se levanta por quem morre à espera na urgência de um hospital?  

Ainda assim, descobri recentemente, na urgência pediátrica do Porto do Serviço Nacional de Saúde nem se espera tanto como nos hospitais privados, quentinhos e com parque de estacionamento privado. Pelo menos ao fim de semana, pelo menos quando lá fui, e já fui duas vezes. Primeira vez: privado - umas 3 horas de espera para insistirem num teste que o miúdo não deixou fazer e que lhes ia permitir cobrar mais uns trocos. No dia seguinte o miúdo na mesma, privado outra vez - 8 horas de espera. Nem pensar. vamos ao público. Em 20 minutos ficou tudo tratado, quase diria que perdi mais tempo à espera de ser atendida na farmácia. Segunda vez, domingo, 7h, 38 graus, diretos ao público: uma hora e meia de espera. 

Não gosto de janeiro, pronto. Chove, faz frio, a roupa não seca, está tudo húmido e há tanta gente a viver tão pior, às vezes levar umas chapadas de pobreza ajuda-nos a colocar muita coisa em perspetiva. À pobreza também. O tempo mais quente ainda demora e as férias também, há sempre demasiado cotão a passear no chão da casa, a única vantagem é que, de toda a roupa que se lava, só é preciso passar a ferro a que se veste por fora, e só se for mesmo preciso. Sim, sou uma dona de casa moderna, sem empregada e reconhecidamente sem jeito, quero lá saber se os lençóis e as camisolas interiores têm vincos. Na verdade até consigo dobrá-las bem dobradinhas de modo a que não se note. Até o pinheiro de Natal continua a enfeitar a sala, já sem enfeites. A caixa parece-me sempre demasiado pequena para conseguir lá guardá-lo e vou eternizando a tarefa com a esperança de que alguém a faça, ou de que ele (o pinheiro) desapareça daquele canto da sala, até me dar o repente do "não aguento mais" e lá vai ele, com caixa ou sem caixa. Puf, até para o ano. 

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